A metodologia de pesquisa de preços, desenvolvida por auditores, já está sendo usada por diversos municípios do Estado.
Uma metodologia de pesquisa de preços, desenvolvida pela Divisão de Fiscalização de Saúde do TCE-MS, contribui para a economia nas aquisições públicas de medicamentos. A utilização de alguns dos procedimentos propostos pelos auditores da Divisão de Fiscalização de Saúde do TCE-MS está sendo aplicada pelos municípios, que já estão conseguindo licitações com preços mais vantajosos para os cofres públicos.
Com o objetivo de difundir a metodologia, os auditores Haroldo Oliveira de Souza e Dafne Reichel Cabral, chefe e supervisora da Divisão de Fiscalização de Saúde respectivamente, detalharam a metodologia por meio de um artigo científico, recentemente publicado na Revista Cadernos, vinculada à Escola Paulista de Contas Públicas do TCE-SP.
Na entrevista a seguir, Haroldo Oliveira de Souza relata como foi o trabalho e os resultados já alcançados.
TCE: As aquisições de bens e serviços, em regra, são realizadas por meio de processo licitatório, a maior parte deles dispostos na Lei nº 8.666/93. Mas fatores mercadológicos podem dificultar a realização de boas compras em termos de custo. Como otimizar os recursos?
Haroldo: A busca pela proposta mais vantajosa para a administração pública é um dos maiores desafios dos processos licitatórios. Acreditamos que estabelecer um método que contribua para melhoria das pesquisas de preços, referências para as futuras contratações, pode ser um caminho para otimizar os recursos públicos, em especial na área da saúde cujas demandas são praticamente infinitas e ainda existem especificidades como escassez de recursos, urgência nas necessidades.
TCE: Quem determina e como são estabelecidos os preços dos medicamentos – o varejista (farmácias e drogarias) e o de venda ao governo?
Haroldo: O mercado de medicamentos possui características que facilitam o estabelecimento da metodologia para formar os preços de referência. Existe uma forte regulamentação do mercado, por meio da Anvisa, que disponibiliza uma tabela com os preços máximos de todos os medicamentos comercializados no país. O Ministério da Saúde, por sua vez, possui um sistema chamado Banco de Preços de Saúde – BPS, que consiste num banco de dados que armazena o preço contratado em cada licitação de medicamentos realizada no País. Por outro lado, temos algumas revistas especializadas que estabelecem os preços praticados no varejo. A composição de todas essas referências de preço permite que o gestor desenvolva um juízo de valor sobre as propostas recebidas dos fornecedores e consiga assim determinar se um preço orçado é caro ou barato, abrindo margem para negociações que resultam em economia ao erário.
TCE: Qual foi o ponto de partida para o desenvolvimento dessa metodologia?
Haroldo: A necessidade de estabelecer um preço de referência que permita ao gestor criar o juízo de valor sobre as propostas recebidas e melhorar a pesquisa de preços realizada.
TCE: O que ela traz de inovação diante de como o trabalho era feito anteriormente?
Haroldo: O procedimento padrão utilizado nas pesquisas de preços é solicitar orçamento com os potenciais fornecedores e a partir das estimativas recebidas, estabelecer o preço de referência para o processo licitatório. Essa prática não permite a formação de juízo de valor adequado para considerar um preço vantajoso ou não para a Administração Pública, pois nada mais será que uma estimativa de por quanto os fornecedores querem vender, e isso nem sempre fica alinhado com a realidade do mercado. Com a metodologia proposta, o gestor parte para a negociação com uma referência de quanto seria um bom valor a ser pago por determinado medicamento, obtendo condições de julgar se determinado preço estimado pelo fornecedor é razoável ou não, deixando de ficar refém dos interesses do mercado.
TCE: Considerando o tamanho de um país com o Brasil, é de se esperar que uma aquisição na cidade de Rio Branco, capital do Estado do Acre, por exemplo, seja totalmente diferente da mesma aquisição realizada nas capitais dos estados do sudeste ou no Distrito Federal. As especificidades de cada caso, por si só, não podem vir a causar discrepâncias nos preços?
Haroldo: Exatamente, isso de fato é uma problemática importante, porém na maioria dos casos observamos uma supervalorização dessas discrepâncias na ocasião dos processos licitatórios. Na compra de qualquer produto no comércio virtual, por exemplo, o preço é sempre o mesmo independente do local do país onde se está. Existem apenas algumas diferenças relacionadas a frete, impostos ou outro possível detalhe. Queremos trazer essa realidade para as aquisições públicas de medicamentos. Haverá discrepâncias regionais, contudo diferenças na ordem de 1000%, como já observamos, não podem ser consideradas razoáveis. Daí a importância de referência para julgar se um preço é caro ou barato.
TCE: Tabelas de referência do comércio varejista interferem nas compras governamentais? É possível comparar as compras realizadas no varejo e as aquisições públicas, que geralmente refletem grandes volumes de produtos?
Haroldo: Não é possível fazer essa comparação de forma direta, pois cada mercado possui suas especificidades. No artigo explicamos como utilizar cada uma das referências disponíveis e o que a jurisprudência dos órgãos de controle diz a respeito delas.
TCE: Conseguir adequar os fornecedores, habituados com a ultrapassada sistemática de envio de orçamento, que acaba superestimando os preços de referência para as licitações, resultando em contratações muito vantajosas para o contratado, é um grande desafio para os operadores de licitação?
Haroldo: Certamente, há um grande conflito de interesses, pois os fornecedores buscam otimizar seus lucros, algo muito justo no sistema capitalista. Todavia, se considerarmos o volume orçamentário da área de saúde pública no Brasil, veremos que o poder econômico da Administração é muito grande, essa força deve ser usada para regulamentar o mercado. De fato é desafiador, mas a Administração deve criar formas de fazer valer o fato de ser um dos maiores players do mercado e não pode ficar refém dos fornecedores.
TCE: Diante dessa metodologia, como tratar casos de urgência inerente à área de saúde, onde a falta de um medicamento pode causar complicações nos tratamentos ou até mesmo a morte do paciente?
Haroldo: A metodologia pode contribuir muito se associada a um planejamento de compras bem feito. Claro que há casos onde não haverá tempo hábil para fazer as pesquisas de preços de medicamentos seguindo todos esses passos, a urgência pode não permitir. Mas esperamos que esses casos sejam as exceções e a regra seja o planejamento e a boa gestão dos recursos.
TCE: Já é possível verificar os resultados da aplicação da metodologia?
Haroldo: Sim, apesar das dificuldades, já é possível verificar resultados práticos com a utilização da metodologia. Dois casos se destacaram pela materialidade da economia gerada. Em sede de controle prévio, foram apontadas falhas na pesquisa de preços e indicadas o método para refazê-la e melhorar os preços estimados para a licitação. Em um dos casos o preço estimado teve uma economia na ordem de 62,5%, e no outro algo perto de 30%. Projetando os valores somados, seria próximo de R$ 30 milhões de reais economizados que podem ser utilizados para suprir outras demandas da área da saúde.
Para ler a íntegra do artigo, acesse o link https://www.tce.sp.gov.br/epcp/cadernos/index.php/CM/article/view/121/109