“A mulher ainda precisa batalhar bastante hoje em dia”. A observação vem de quem tem propriedade de nove décadas de vida e que pôde acompanhar diferentes momentos da desigualdade de gênero. Terezinha Braga Freire, de 92 anos, estava entre as tantas mulheres que lotaram, nesta segunda-feira (21), o plenarinho Nelito Câmara, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALEMS), para participar do evento “Dia Lilás”. O encontro, realizado pela Escola do Legislativo Senador Ramez Tebet, proporcionou uma tarde de conhecimento, debate sobre a necessidade da transformação cultural e a importância da imagem no avanço da autoestima.
A observação de Terezinha Freire é atestada pelas estatísticas de violência contra a mulher que ainda permanecem elevadas. Entre esses números, estão os mencionados pela deputada Mara Caseiro (PSDB), presidente da Escola do Legislativo e propositora do evento. A parlamentar informou que, apenas neste ano, 17 mulheres foram vítimas de feminicídio em Mato Grosso do Sul e, em 2022, foram registradas 44 mortes de mulheres. “Infelizmente, a mudança de pensamento não acontece no tempo e na forma como gostaríamos. Por isso, precisamos permanecer nesta batalha até que possamos, um dia, ter, de fato, igualdade de direito e o fim de todo e qualquer violência contra as mulheres”, disse a deputada no início da reunião.
Mara Caseiro também destacou a importância da educação na transformação cultural e o papel do Legislativo na promoção de ações como a realizada na tarde desta segunda-feira. “A educação é imprescindível para redução da desigualdade de gênero, para a quebra da objetificação da mulher, para o entendimento dos direitos iguais, para o respeito aos sonhos, objetivos e escolhas da mulher”, comentou a deputada. “Por isso que o Legislativo realiza, nesta tarde, o ‘Dia Lilás’ para que possamos ajudar na conscientização sobre a violência de gênero, como também na autoestima e no empoderamento das mulheres”, acrescentou.
A tarde de conscientização e valorização da autoestimativa – como a deputada Mara Caseiro definiu o evento – contou com participação de inúmeras mulheres, que lotaram o plenarinho. A busca de conhecimento, sem limite de idade, foi um dos principais motivadores. E foi por essa razão que Terezinha Freire se dirigiu hoje à Assembleia Legislativa, acompanhada de sua filha. “Estou aqui para isso mesmo, para aprender”, contou. Perguntada sobre o processo de conquistas dos direitos da mulher, ela foi enfática: “A mulher ainda precisa batalhar bastante hoje em dia”. Mas ela reconhece que “há avanços, apesar de tudo”.
Mudança cultural é fundamental na luta contra a violência
O enfrentamento da violência também passa pela transformação cultural, como enfatizado pela promotora de Justiça, Clarissa Carlotto Torres, coordenadora do Núcleo da Cidadania (Nuce) do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS). “Gênero é uma construção social sobre os diferentes papeis atribuídos a homens e mulheres. Por exemplo, as meninas ganham brinquedos relacionados a meninas e os meninos só brinquedos relacionados a meninos. É a sociedade que impõe em que o homem e a mulher devem trabalhar e as diferentes tarefas no dia a dia. O problema dessa construção cultural é que se coloca para mais o que é do masculino e para menos o que é do feminino. E assim é estabelecida uma relação desigual, que pode culminar na violência”, explicou.
A cultura arraigada na sociedade torna a violência contra a mulher, muitas vezes, imperceptível, até mesmo à vítima. Foi pensando nisso que o MPMS desenvolveu uma ferramenta chamada “Violentômetro”, um dos assuntos abordados pela promotora de Justiça, Aline Mendes Franco, coordenadora do Núcleo de Atendimento às Vítimas de Crimes e Atos Infracionais Violentos (Navit).
O “Violentômetro”, conforme explicou a promotora, ajuda a mulher a notar os diferentes níveis de violência que sofre, destacando essas etapas com cores diferentes: amarelo para “fique atenta”, laranja para “reaja” e vermelho para “alerta, vida em perigo”. No primeiro caso, há ações como chantagear, mentir, enganar, ridicularizar, ofender, humilhar a mulher em público, além de ciúme excessivo e ameaças. No segundo momento, o agressor destrói bens pessoais, xinga, “brinca” de bater, belisca, empurra. No último nível, acontecem lesões corporais, ameaça com armas, abuso sexual, espancamento e morte.
Colorimetria e a wollying
Termos que, certamente, a maioria dos presentes ainda não conhecia foram assuntos das outras duas palestras: a colorimetria e a wollying. O primeiro tema foi discorrido pela pedagoga e especialista em cosméticos, Djenane Miranda, que proferiu a palestra “Colorimetria e Imagem Pessoal”. Na sequência, a palestra, intitulada “Agosto Lilás e wollying“, foi apresentada pela psicanalista e especialista em psicologia positiva, Kaká Ribeiro.
“A colorimetria na maquiagem destaca a importância de utilizar cores e tons certos para evidenciar os pontos fortes da mulher. Isso porque o que deixa uma mulher linda já está nela: o tom da pele, a cor e textura do cabelo, os olhos, as sobrancelhas, entre outros detalhes”, disse Djenane Miranda, que já recebeu o convite para retornar à Casa de Leis e realizar uma oficina sobre o tema. “Quando falamos de autoestima, estamos também falando do poder da nossa imagem. A imagem é uma ferramenta muito importante: pode abrir portas e ajudar a se destacar no mercado de trabalho, por exemplo. A construção da imagem pessoal é uma comunicação não verbal. Querendo ou não sempre estamos comunicando algo”, explicou.
Já o wollying, termo criado pela psicóloga canadense Tracy Vaillancourt, é a junção das palavras inglesas “woman” e “bullying”, segundo informou Djenane Miranda. “É o bullying que a mulher pratica contra a mulher”, definiu. Ela contou que isso é muito comum em todos os lugares e destacou, em sua fala, o ambiente de trabalho. “O wollying cria um ambiente negativo e tóxico”, disse. “Isso faz com que a vítima tenha queda na motivação, o que pode afetar seu desempenho no trabalho. Também pode levar à insatisfação geral e à alta rotatividade de funcionárias qualificadas”, disse.
Enfrentamento da violência contra a mulher, uma luta de toda a ALEMS
O evento também contou com a participação da deputada Lia Nogueira (PSDB), que mencionou uma proposta de sua autoria que tramita na Casa de Leis. O Projeto de Lei 67/2023 obriga os hospitais, clínicas, postos de saúde que integram as redes pública e privada a disponibilizarem funcionária do sexo feminino para acompanhamento de exames ou procedimentos que induzam a inconsciência total ou parcial da paciente mulher.
A deputada também destacou que o enfrentamento da violência contra a mulher é de toda a ALEMS, incluindo os parlamentares homens. “Quero dizer que o Parlamento Estadual é parceiro das mulheres. Temos aqui deputados homens que são sensíveis à causa, que nos trata com respeito que deve se ter na política e em todos os espaços”, afirmou.
A reunião foi transmitida ao vivo pela comunicação institucional da Casa de Leis. Confira a íntegra do evento no vídeo abaixo: