Diferentes registros da inflação ao longo do ano devem impactar de formas opostas a situação fiscal do país em 2022, apontou a Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI) no seu relatório de acompanhamento fiscal do mês de julho. O documento, publicado nesta quarta-feira (14), mostra que a inflação de julho vai dar mais folga para o cumprimento do teto de gastos, mas esse espaço deve ser comprimido pela inflação projetada para dezembro.
Segundo explica a IFI, é a inflação de junho, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que reajusta o limites de gastos públicos para o ano seguinte. O índice registrado, de 8,35%, vai representar um crescimento de R$ 124,1 bilhões no teto, que passará de R$ 1,49 trilhões em 2021 para R$ 1,61 trilhões em 2022.
No entanto, a inflação apurada em dezembro, através do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), tem grande impacto no reajuste das quatro despesas que perfazem a maior parte dos gastos públicos obrigatórios: Previdência, seguro-desemprego, abono salarial e Benefício de Prestação Continuada (BPC). Os dois primeiros são reajustados diretamente pelo INPC, enquanto os dois últimos são indexados ao salário mínimo, cujo valor é corrigido pelo índice no início do ano. Esses quatro programas sociais representam 56% das despesas primárias da União.
O IPCA é calculado a partir da variação do custo de vida médio de famílias com renda mensal entre um a 40 salários mínimos. Ele é a referência principal para o controle da inflação e a taxa oficial de juros. Já o INPC, mais usado para políticas sociais, verifica a variação do custo de vida médio das famílias entre um e cinco salários mínimos.
No cenário de junho, a projeção para o INPC de dezembro é de de 5,8%, o que provocaria um crescimento de R$ 76,8 bilhões nas despesas primárias. Assim, a IFI projeta que a diferença entre o teto de 2022 e os gastos sujeitos a ele será de R$ 47,3 bilhões. Esse valor corresponde ao espaço disponível para a inclusão de novas despesas no ano que vem sem descumprir a regra fiscal. Entre as medidas que podem ocupar esse espaço estão uma eventual ampliação do Bolsa Família, reajustes salariais para servidores públicos ou uma retomada das despesas discricionárias — obras e investimentos.
“O espaço gerado pela inflação mais alta de junho dá sobrevida à regra [do teto], mas não impede que os gastos voltem a pressionar o limite. Nos cenários atuais, o risco de descumprimento passou a ser elevado a partir de 2027. Houve uma melhora em relação a cenários passados. A dinâmica que faz com que os gastos alcancem o teto ainda está presente, apesar do alívio temporário”, afirma a IFI.
Dívida
A instituição classifica a situação da inflação brasileira como “preocupante” e lembra que ela pode provocar aumento na taxa de juros, o que teria influência direta sobre a gestão da dívida pública. Atualmente, a taxa Selic está em 4,25% ao ano.
Os meses de abril e maio apresentaram sinais de melhora no perfil da dívida, com uma redução da participação dos títulos de prazo curto (vencimento em até 12 meses) no estoque da dívida. Porém, a taxa média de juros nos títulos emitidos nos últimos meses apresenta crescimento, o que reflete ceticismo quanto à perspectiva fiscal do país, diz a IFI.
“De acordo com o Tesouro, em maio, as taxas médias de emissão dos títulos foram de 6,91% ao ano para os prefixados de 24 meses e de 7,97% ao ano, para os prefixados de 48 meses. Levantamento feito pela IFI junto ao Tesouro mostra que houve novas altas nas taxas de emissão de títulos em junho e julho. Nos títulos prefixados com vencimento em 1º de janeiro de 2023, por exemplo, as taxas médias de negociação foram de 7,15% ao ano. Nos títulos com vencimento em 1º de julho de 2024, as taxas médias foram de 8,08% ao ano. Informações preliminares referentes aos leilões de julho indicam ter havido continuidade nesse movimento no mês corrente. Esses números reforçam as incertezas presentes no cenário, a despeito da redução nos prêmios de risco-país”.
Atividade econômica
As previsões para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2021 continuam sendo revisadas para cima, segundo a IFI, de acordo com a gradual retomada da atividade econômica no país, mas o mercado ainda enxerga riscos. Entre eles está a possibilidade de uma carência hídrica, que poderia levar a uma crise de abastecimento energético, com racionamentos e apagões.
Também causa preocupação o ritmo da vacinação contra a covid-19 no Brasil. Segundo verifica a IFI, a imunização da população avançou entre maio e junho e atingiu um pico de 1,4 milhão de doses diárias no final do mês, mas, recentemente, estagnou em 1,1 milhão de doses por dia — abaixo do necessário para atingir um percentual significativo de proteção contra o vírus.
“O percentual de pessoas completamente imunizadas é ainda distante do nível considerado seguro ou ideal, o que ainda preocupa dada a disseminação de variantes mais infecciosas do SARS-CoV-2. Até o dia 11 de julho, o número de pessoas que receberam também a segunda dose de uma das vacinas disponíveis é de 28,1 milhões (ou 13,2% da população).